quinta-feira, 28 de julho de 2011

Internado - parte 2

Atado numa cadeira, Antônio acordou num quarto minúsculo. A cama ao lado, completamente suja, enojava o detetive. O piso estava umedecido, congelando seus pés descalços. Um cheiro forte o desorientava. Um ruído o atordoou por um momento e uma voz começou a falar.

– Antônio Marcos de Oliveira. Detetive do departamento de polícia da nossa capital. Bem vindo. Eu sou o Dr. Mohamed Nunes, diretor deste maravilhoso estabelecimento particular. Quem diria, hein? Você deve ser muito bom para descobrir a origem dos restos.

– Restos? - tonto, o investigador se esforçava para responder.]

– Os corpos que encontrou, detetive. O parabenizo pela sua astucia. Ou sorte. Infelizmente, seria uma lastima se nos impedisse. Ainda assim, por curiosidade, estudei o seu passado. Descobri que há três anos atrás participou da investigação de um piromaníaco, que custou a morte de sua namoradinha. Após isso, você entrou em depressão.

– Como sabe disso tudo?

– Isso não importa. O que interessa agora é que você está ruim, e como médico, é meu dever tratá-lo. Começando agora mesmo. E durante o tratamento gostaria de fazer alguns testes. Enfermeira Laura, por favor, dirija-se ao quarto 318.

Antônio notou usar não a sua roupa costumeira, mas um avental hospitalar. Uma loira, com cicatrizes nos braços e pernas, entrou na cela.

– Olá. Eu sou a Laura. - disse ela, abrindo um grande e alegre sorrizo - Eu mesma troquei sua roupa, sabia? Você até que é gostosinho.

A mulher subiu no colo do homem, encostando um bisturi no peito dele. Ela então encravou a lâmina em sua própria coxa e abriu uma ferida.

– Ah! Isso! - a enfermeira urrava de dor e prazer. Passou a mão no fluido vermelho que escorria, esfregando-o na boca de Antônio - Beba. É tão bom. Vamos fazer juntos. Sim!

– Enfermeira, pare de brincadeiras e trabalhe! - advertiu a voz do doutor.

– Aah... - decepcionada, inseriu uma seringa num frasco e sugou seu conteúdo - Hora do remédio, seu menino levado.

– O que está me dando? - perguntou ele, enquanto levava a injeção.

– Apenas algo para abrir sua mente.

A visão do policial ficou embaçada. Sentiu a mulher o soltando da cadeira. A voz ecoada de Mohamed o alcançou:

– Não se preocupe, sua visão voltará em alguns segundos. Vá para o quarto 140. Use o elevador. Não tente fugir, as portas estão trancadas, e estarei vigiando pelas câmeras do prédio. Se quiser bater um papo, espalhei escutas por todo o terreno. Estarei ao seu dispor.

Recuperando sua visão, Antônio iniciou sua jornada ao elevador. Algumas macas enferrujadas atrapalhavam seu caminho. Checou as portas, e realmente estavam trancadas. Nos corredores, viu várias linguas pregadas numa das paredes encardidas. Exalavam um odor terrível da decomposição, com moscas saltitando de uma em uma. Acima da carne podre, um aviso escrito em sangue:

“SILÊNCIO DENTRO DO HOSPITAL”

sábado, 16 de julho de 2011

Internado - parte 1

Sugiro para não se perderem http://felipeintruso.blogspot.com/2011/01/incendio-parte-1.html


Ruas imersas na escuridão. As lâmpadas dos postes piscavam freneticamente. Aquele teatro. Parecia familiar. Dos corredores, via uma luz provindo dos interiores, acompanhada de uma melodia. Passando silenciosamente pelas poltronas, alcançou o palco. Os corpos de um senhor e um garoto, pendurados nas cortinas, se contorciam com os olhos virados. Uma mulher de cabelos curtos tocava um piano flamejante. Sentiu ter ouvido aquela música antes. A pianista parou, virando-se. Levantou e aproximopu-se do expectador.

– Você veio. - a mulher o abraçou emocionada - Eu te amo tanto.

De repente, a face da moça tornou-se em carne viva, acordando o homem do pesadelo. Antônio, de bruços na escrivaninha de seu escritório, coçou os olhos e enxugou o suor da testa. Tentando manter-se acordado, analisava documentos de vítimas recentes. Procurou o remédio nas gavetas. Nada. Aqueles pesadelos. Terapias, medicamentos e ainda assim as visões continuavam. Doutor Pedro e seu filho, Roberto, cremados. Júlia suicidando-se com um tiro. O fogo. Cenas que se repetiam na mente do detetive. Pioravam a cada dia. Alguém entrou.

– Como vai a investigação, Antônio? - perguntou o chefe de polícia.

– Todas as vítimas foram encontradas com orgãos faltando, mostrando que o assassino é possivelmente o mesmo. Porém, a área de ação dele é muito extensa. Estamos empacados.

– Entendo. - o velho notou a feição triste do amigo - Olha, por que você não vai para casa descansar?

– Preciso não. - disse foliando os arquivos.

– Não foi um pedido. Eu sei que não é fácil perder alguém. Só que já fazem três anos, Antônio. Você precisa superar isso. Deve lutar e aceitar o que aconteceu.

– Quem me dera... - fechou tudo e guardou, lembrando da verdade que ele escondia sobre a falecida amada - Estou indo. Boa Noite.

– Boa.

A chuva comprometia a visão do homem. Cansado, ele dirigia vagarosamente, olhando ao redor do veículo. O que é pior afinal? Perder a amada, ou descobrir que era uma assassina? Chegando, encontrou um mendigo na entrada do edifício.

– Senhor Antônio? - perguntou o indivíduo.

– Sim. Como sabe meu nome?

– Os corpos. Sei de onde eles vem.

– Corpos? Os sem orgãos?

– Sim. Toda noite uma van deixa-os nas ruas.

– Uma van.

– Sim.

– E por que não avisou a polícia antes?

– Não me deixaram entrar. Então te segui até descobrir onde morava.

– Sei. È isso?

– Não. Tem um nome escrito na van. Centro Hospitalar Abarão Porciano Clife.

– Um hospital? Estranho... Obrigado pela informação. Gostaria de entrar? Comer algo?

– Não. Prédios me assustam. - o sujeito saiu aos murmúrios.

Antônio pesquisou sobre o local. Ficava distante da cidade, num campo fechado. O terreno cobria vários hectares, contornado por uma vasta floresta. Era caríssimo e exclusivo, tendo pouca popularidade. No dia seguinte, o detetive se dirigiu ao centro médico. Os portões principais estavam escancarados. Interfonou, sem receber resposta. Invadiu com o carro. Atravessando diferentes jardins, alcançou a mansão. Estatuas de bestas e pessoas desnudas davam boas vindas ao investigador. Uma recepção vazia o recebeu. Papeis espalhados. Espirros de sangue pelas paredes. Estaria abandonado? Decidiu vasculhar. Ao dar o primeiro passo, sentiu um golpe e desmaiou.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

CCN-SR: Confusões de uma Colegial e seu Namorado-Servo Robô #8

Apoiado numa escrivaninha, analisava uma foto. Ainda se lembrava de cada detalhe daquele momento congelado no tempo. Ele, abraçado a Renata, acabava de pedi-la em casamento. Ela, com a ajuda do parceiro, terminava de construir Thiago. Melancólico, passava a mão nos cabelos grisalhos. Sobre a mesa, a máscara o fitava, mostrando suas dores e deveres estampadas na face avermelhada do demônio. Tirou o sobretudo, trocando-o por uma capa violeta, encapuzando-se.

– Você não vai para a Terra de novo, vai? - indagou uma aparição aquática em forma de mulher.

– Vou. Algum problema? - dizia o homem.

– Claro que sim! Acha que ir todo dia para aquela dimensão irá trazê-la de volta? Por que não fica aqui comigo? Podemos nos divertir um pouco. - a dama d’água acariciava o peitoral do sujeito.

– Agradeço sua boa vontade, Undine, mas é o que eu quero fazer por hora. - afastou as mãos dela.

– Pois bem. Estarei aguardando, meu amado mestre. - o espírito desapareceu.

Ignorando a espada e seu segundo rosto, Anônimo transportou-se para a Terra. Era noite. As ruas, pouco movimentadas. Saltando de prédio em prédio, foi até uma biblioteca. Sentou-se a beira do edifício. Observava a lua, recordando como ele a noiva costumavam visitar aquele mundo, cheio de maravilhas e surpresas. Ouviu um grito. Num beco do outro lado da rua, notou um tumulto. Uma moça em uma fantasia de couro apertada era abordada por um grupo de arruaceiros. Rodeando-a, os meninos a empurravam de um lado para o outro. Um dos membors notou a figura encapuzada emergindo na outra calçada.

– Perdeu alguma coisa amigo? - ameaçou o marginal, tentando o rosto do indivíduo. O mesmo não respondia. A vítima, desorientada, caiu no chão - Se pretende fazer alguma besteira, pode esquecer. Somos cinco contra um.

O homem continuou em silêncio. Um dos bandidos se aproximou dele e tentou empurrá-lo. Anônimo desviou, derrubando o garoto com um golpe. Após o ataque, todos os meninos partiram para cima dele. Um deles tentou esfaqueá-lo. O encapado desarmou-o e lançou a faca em outro oponente, enquanto nocauteava o primeiro. Entre murros e chutes, Anônimo derrotou os adversários. Um deles, afastado da briga, apontava uma arma para a garota.

– Afaste-se de mim seu louco! - gritava ele.

Anônimo fitou os olhos do garoto. Esse sentiu uma forte dor de cabeça, tendo alucinações. Assustado, disparou a arma e desmaiou. A bala acertou o homem. A moça tentava encontrar os óculos perdidos na escuridão. Anônimo pegou-os e os colocou na menina, que voltou a enxergar.

– Que...quem é você? - falou ela, espantada com a aparência sombria do justiceiro.

Sem responder, ofereceu a mão para ajudá-la. Ela ficou em pé, ajeitando os cabelos castanhos.

– Obrigada... seja lá quem você for. Eu sou Bruna, prazer - esticou o braço para cumprimentá-lo. Ele não se moveu.

– Você não deveria andar assim a essa hora da noite. - advertiu ele.

– Eu sei...Tudo aconteceu tão rápido. Numa hora realizo um dos meus desejos, na outra, sou abordada num beco. Que noite cheia, hein? - falava ela, ainda surpresa em beijar Thiago.

Anônimo cambaleou repentinamente, segurando o tórax.

– O senhor está bem?

– Sim. Não se preocupe comigo.

– Olha! Está sangrando. Vou chamar uma ambulância.

– Não. Sem ambulância.

– Mas você precisa de ajuda!

– Eu apenas preciso tirar a bala.

– Então... vamos para a minha casa. Ela não fica muito longe daqui. - a garota colocou o braço do homem nos ombros e o ajudou na caminhada.

Chegando em uma residência mediana, Bruna deitou o ferido no sofá e tirou sua roupa. Trouxe antibióticos e ataduras. Anônimo pediu uma faca. Agonizando, ele tirou a bala. A pequena enfermeira atou as faixas e fez um curativo. Deu alguns medicamentos para o paciente.

– Obrigado. - agradeceu ele, levantando-se.

– Por nada. Não vai descansar um pouco?

– Já me sinto melhor. E seus pais não gostariam de encontrar um estranho na casa deles.

– Eles viajaram.

– E não se importa de ficar sozinha nessa casa?

– Tudo bem. Estou acostumada. Eles sempre saem por causa do trabalho. É normal.

– E se alguma coisa acontecesse? - terminava de vestir suas roupas.

– Bem... - a moça não soube responder.

Passando os dedos na barba, o homem preocupou-se com a situação de Bruna. Do bolso da camisa, tirou um colar com um pequeno cristal rosado. Anônimo fez um gesto e disse algumas palavras em língua desconhecida.

– Posso? - disse ele, abrindo a peça.

– Ah...sim. - a nerd elevou os cabelos. O misterioso pôs o colar na jovem.

– Indiferente do que acontecer, nunca tire isso. Ele te protegerá de qualquer ameaça. Se precisar de mim, basta pensar que apareço sem falta.

– Certo... - confusa, aceitou o presente de bom grado - Eu não sei seu nome.

– Não precisa saber.

– Preciso sim. Você sabe o meu. Diga o seu agora.

– É...Danilo. - disse, colocando o capuz, receoso em revelar sua identidade.

– Mais uma vez, obrigada, Danilo.

O homem se dirigiu ao banheiro.

– Quando te verei de novo? - perguntou Bruna.

– Em breve. - Anônimo fechou a porta.

– Em breve quando? - ao abrir o sanitário, ele não se encontrava. Perdida com o repentino sumisso de seu salvador, Bruna sentou encostada na parece do box, admirando a misteriosa jóia que recebera.

De volta a base, Danilo tornou a observar a foto dele e de renata. Atento a imagem da amada, conversava com o objeto:

– Hoje conheci uma garota. Uma boa menina. Ela cuidou de mim. Lembra um pouco você na nossa época de escola. Queria que a conhecesse. Se não tivesse aparecido no momento certo, ela estaria morta. Infelizmente não pude fazer o mesmo por você. Por isso eu tenho que virar um deus. Assim lhe trarei de volta a vida, e juntos criaremos um novo universo. Um onde pessoas como Bruna não sofram mais. Não haverá injustiças, fome ou miséria. Quem se opor a nós, será eliminado. O DPI irá pagar por tirarem você de mim. Aguarde meu amor, logo nos uniremos para sempre.